Pessoas ficam mais criativas em ambientes criativos

Aprender tornou-se uma tarefa permanente. As atitudes e os ambientes devem se transformar para facilitar o aprendizado.

Rique Nitzsche, autor AutorRique Nitzsche Seguidores: 273

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«Causa e efeito não estão próximos no tempo e no espaço». Peter M. Senge, A Quinta Disciplina, 1990.

Acreditamos em contos de fada. Como crianças, os administradores privados e públicos insistem em soluções a curto prazo. Fomos educados ouvindo e assistindo histórias nas quais as tragédias acontecem no curto prólogo e as soluções heróicas resolvem-se antes do epílogo no qual os protagonistas terminam felizes para sempre. Quando adultos, com a responsabilidade de gerenciar processos, continuamos a pensar que causa e efeito estão próximos, como em um conto de fadas.

A vida contemporânea é extremamente mais complexa do que as histórias infantis que continuamos a repetir para nossos filhos. As planejadas linhas de produção da era industrial não resolvem os problemas complexos da era do conhecimento. As recentes certezas estão evaporando cada vez mais rapidamente. Os complexos algoritmos também não resolvem a profunda desordem da economia mundial. A única certeza é a imprevisibilidade acelerada das mudanças. Ou nos preparamos para uma adaptação rápida às transformações, ou ficaremos parados à beira desse tempo volátil.

Como professor de design thinking, uma disciplina que está sendo testada na ESPM-Rio desde 2010, fico entusiasmado quando vejo que as características do design thinking estão sendo aplicadas em outros lugares. Design thinking é uma metodologia pragmática e colaborativa, completamente aberta às novas ideias e experiências, mas principalmente baseada em prototipagens rápidas e iterativas. A pesquisadora Michele Rusk identificou algumas características pessoais comuns atribuídas aos design thinkers, tais como ampla curiosidade, habilidade para empregar conhecimento tático, habilidade para desenvolver percepção consciente e lampejo estimulante, habilidade para entender problemas complexos e identificar as causas mais profundas dos problemas, habilidade para antecipar e visualizar cenários, habilidade para inventar ideias e sínteses e habilidade para solucionar problemas. Rusk diz que criatividade é o pensar, que inovação e design são o fazer. Os design thinkers, teriam a habilidade crucial de trocar o estilo de pensamento divergente para convergente e, quando necessário, suspender qualquer julgamento que atrapalhe o processo.

Já escutamos diversas vezes a ideia de que precisamos ensinar os alunos a pensar. Precisamos fazer muito mais do que isso. Ensinar é diferente de aprender. Embora estejam na mesma frase, no mesmo cenário, existe uma ponte entre os dois verbos com um tráfego em sentido opostos. Os ambientes de ensino foram projetados para ensinar, não para aprender. Precisa-se criar um ambiente propício à adaptação, à transformação, à mudança inevitável dos modelos de negócios e do próprio ensino. Ambiente no qual possamos testar novas formas de ensinar aprendendo ao mesmo tempo, compartilhando experiências, convergindo tendências. Esse pensamento me leva à experiência bem sucedida da Bauhaus, a escola de design que ensinava aprendendo, onde professores e alunos pensavam fazendo.

No último encontro de Steve Jobs com Bill Gates, em 2011, os dois conversaram sobre como seriam as escolas do futuro. Gates acreditava que os alunos assistiriam às aulas ou lições por conta própria através de vídeos. O tempo em classe seria para debates e resoluções de problemas, que seria um pensar coletivo. Porém, ambos concordaram que o impacto da tecnologia digital nas escolas ainda era decepcionante. A educação resiste em mudar, em investir em motivações emocionais para cativar os alunos. O mundo educacional demanda por mais conexão e relacionamento, onde o professor deveria ser um facilitador de trocas de experiências. Talvez por isso os dois tenham abandonado a universidade no primeiro ano, à procura de uma experiência mais prática, mais autêntica, mais relacionada com vida real.

Diversas experiências educacionais estão sendo feitas pelo mundo. O inglês Geoff Mulgan é o diretor da Young Foundation, um centro para inovação em empreendimentos sociais e políticas públicas. A equipe de Mulgan investigou jovens, pais, professores, empregadores e os responsáveis pelas disciplinas das escolas, tanto na Inglaterra como em outros países. Eles entenderam que precisavam atuar também através das habilidades não cognitivas dos alunos, além de incentivar sua motivação e resiliência. O formato das Studio Schools surgiu em homenagem aos estúdios da Renascença, onde o trabalho e o aprendizado estavam integrados. As escolas são pequenas, com um currículo radicalmente baseado em trabalhos práticos e reais para empresas e ONGs. A ideia principal era a de aprender-fazendo, em grupos colaborativos e em processos vinculados ao mundo real. Exatamente como a Bauhaus fazia, ou como os cursos de design thinking fazem.

Daniel Pink, autor de A Whole New Mind, acredita que estamos na Era Conceitual, na qual precisamos complementar a atividade cerebral com aptidões essenciais. Para ele, a primeira dessas aptidões é o design. Pink cita o exemplo de uma escola para alunos do ensino médio que moram nos bairros turbulentos da Philadelphia:

«Bem-vindos à CHAD, Charter Hight School for Architecture and Design, uma escola pública que está demonstrando o poder de expansão da mente dos jovens proporcionado pelo design, ao mesmo tempo que desfaz o mito de que seja uma atividade para uma minoria».

Os adolescentes da escola nunca tinham tido aulas de educação artísticas, somente 1/3 aprendeu a ler e teve aulas de matemática na segunda série do ensino fundamental, 3/4 são afro-americanos e 88% pertencem a minorias. Mas, se seguirem a trillha dos outros alunos anteriores, 80% irão fazer cursos superiores de dois ou quatro anos de duração.

Outro exemplo é o da designer Emily Pilloton que mudou-se para a área rural de Bertie County, uma pequena cidade de 20 mil habitantes, a mais pobre da Carolina do Norte. Pilloton optou por participar de um audacioso experimento de transformação da comunidade, liderada pelo design. Junto com seu parceiro Matthew Miller começaram introduzindo o design na educação pública, mas sua atuação se expandiu para a comunidade que tinha uma extrema necessidade de conexão em uma nova perspectiva de futuro. A educação se transformou em um enorme veículo criativo para o desenvolvimento da comunidade. Assim, o sistema escolar está se tornando um catalizador de uma comunidade mais integrada e conectada. Sua intenção é ensinar design thinking para a garotada, com o objetivo de aumentar o capital criativo da comunidade dessa geração. Design thinking seria um antídoto contra a chatice e rigidez da educação tradicional, porque ele é prático, participativo e interativo. Assim, de um recurso até então inexplorado, a juventude se transforma em um valor para a sociedade, projetando um novo futuro.

Existe muita gente sinalizando a necessidade de uma mudança mais radical na experiência do aprendizado. Assim como existem experiências apontando a metodologia do design como uma oportunidade possível e pragmática. Não adianta mais entender que se precisa ensinar os alunos a pensar. Todos os dias assistimos no noticiário algo que afeta diretamente o nosso negócio ou a nossa vida e que não havíamos previsto. Precisa-se ensinar os alunos a pensar de maneira ágil e adaptável. Precisa-se aprender a surfar sobre as mudanças que vêm em ondas.

O adulto, motivado por necessidade e interesse, quer assumir o controle do seu aprendizado, não encerrado em ambientes disciplinares, mas em atividades colaborativas abertas. As pessoas adultas só aprendem o que querem aprender, o que faz sentido para seu próprio interesse e seu crescimento. Esse pensamento se aplica às empresas ou à qualquer grupo de pessoas. Peter Senge dizia que as organizações deveriam criar ambientes para que o conhecimento tenha cada vez mais espaço para se desenvolver através de equipes colaborativas para estabelecer um objetivo comum, para alcançar um futuro melhor. Ele também falou sobre os problemas atuais, que não podem ser resolvidos sem uma mudança radical na forma de pensar, agir e de aprender.

Minha experiência como profissional e educador de adultos mostrou que a metodologia do design thinking pode ser um poderoso processo estratégico de transformação de marcas, negócios, empresas e pessoas. O design thinking vem sendo aplicado no desenvolvimento de produtos ou serviços, no ensino de administradores estratégicos, na administração pública e na melhoria dos processos da sustentabilidade. Entendo que Eduard Lindeman tinha razão quando dizia que a experiência é a fonte mais rica para a aprendizagem do adulto, seu recurso mais valioso. O aprendizado deve estar alinhado com a própria vida dos alunos, com as suas necessidades e motivações.

Como o conhecimento fica cada vez mais disponível para todos, a mudança deve estar em como fazer com que a informação possa ser absorvida pelas pessoas, conquistando significado e valor mais permanente para elas. Na minha opinião, isso pode começar pelo redesenho físico das próprias escolas de negócios. As salas de aulas, assim como os ambientes de trabalho, precisam se adaptar à mudança que já aconteceu na mente e na vida diária das pessoas. Pode-se projetar um ambiente multifuncional mais tolerante à nova tecnologia mutante, mais flexível para atender às inevitáveis futuras mudanças.

Paulo Reis, meu parceiro de jornada educacional, e eu acreditamos em construir processos educacionais com mais de um facilitador em sala. Tivemos uma turma do curso de design thinking que conseguiu projetar, em um intenso processo colaborativo e interdisciplinar, um ambiente mais adequado ao aprendizado criativo. Nosso desafio inicial foi: — Onde vocês gostariam de aprender? A partir disso, os próprios alunos desenvolveram um projeto que foi apresentado à diretoria da ESPM do Rio de Janeiro. O conceito dos ambientes mais flexíveis, iluminados e coloridos, com uma sala de estar anexada, seduziu a diretora Flávia Flamínio. O conceito foi adaptado à realidade da reforma do prédio da pós-graduação no Rio. O arquiteto responsável aderiu com entusiasmo ao processo e o sétimo andar do prédio já está pronto para abrigar novas experiências educacionais. Fizeram-se algumas prototipagens para experimentar o Andar do Design Thinking e todos os participantes ficaram entusiasmados com «a sala divertida» que pode servir de incentivo a qualquer disciplina.

Em todas as experiências citadas existem atributos em comum, como o bom humor, emoção intensa e a prática explícita e coletiva do design. Além disso, o aproveitamento sinérgico da criatividade humana. Costumo dizer que o design thinking é solidário e não solitário.

«Criar, de fato, significa iluminar aquilo que antes estava escuro, dar forma àquilo que antes era caótico, gerar aquilo que nunca antes havia sido criado nem gerado, antecipar o futuro, produzir o porvir».

São palavras de Domenico de Masi. Ele acredita, como muitos, que nunca foi tão necessário estar consciente para efetuar as mudanças necessárias da sociedade. Nunca antes na história foi tão necessária a criatividade. Masi também acredita que a criatividade é doadora de sentido, de vida, de paz, de força.

Criatividade costuma ser alegre. Os criativos sabem disso. Criatividade, mesmo rebelde e impertinente, é surpreendente, universal e se comunica com qualquer pessoa. Para mim, o mistério da criação é uma tarefa que se pode ensinar e compartilhar. Eu sou otimista e acredito que podemos criar uma cultura educacional muito mais criativa.

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