Método simplificado para construção de um sistema de identidade visual

Na hora de projetar a identidade visual, muitos alunos de design sentem falta de um modelo que mostre uma visão do processo. Neste artigo é apresentado um modelo simplificado.

Ricardo Martins, autor AutorRicardo Martins Seguidores: 86

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A construção de um sistema de identidade visual (SIV) pode ser realizada de diversas formas, seguindo diferentes caminhos. O que eu apresento aqui é uma sugestão de método para visualizar melhor as fases de construção do SIV e suas relações. Procurei tornar o infográfico mais simples, reduzindo a quantidade de informações, de modo a privilegiar o entendimento básico. Obviamente, diferentes designers usam diferentes caminhos, alguns mais simples, outros mais complexos. Independente da maneira como se faz, o importante é sempre refletir sobre o método utilizado e criticar cada etapa, pois se uma parte do processo for mal-feita, o resultado das etapas seguintes fica comprometido. Um erro na definição do DNA afeta todo o projeto assim como um erro de seleção do caminho criativo também pode levar a uma solução que não resolve o problema.

O infográfico pode ser visto a seguir:

Conforme pode se ver no infográfico, a construção de um sistema de identidade visual passa por diversas etapas (indicadas pelas letras de A a L, na imagem).

A. Descrição do DNA

Aqui são levantados os dados principais sobre a entidade (organização, instituição, produto, marca, evento, artista, cidade, país etc.). Essas informações envolvem tanto dados internos (tipo de entidade, razão de ser, quais os valores principais, diferencial, comunicação) e dados externos (concorrência, entidades similares, estado da arte). Geralmente envolvem diferentes pesquisas como auditorias, entrevistas, levantamentos fotográficos e documentais etc. O resultado dessa fase se transforma num Dossiê. É preciso ter cuidado, pois nem sempre o máximo de informação é vantajoso. Muitos dados podem levar ao problema conhecido como «analysis paralysis».

B. Redução do DNA

De posse das informações sobre a entidade e o contexto onde ela se encontra, é preciso sintetizar os dados e organizar um documento contendo as informações relevantes para a equipe que irá desenvolver o sistema de identidade visual (SIV). Os dados principais geralmente são trechos do Dossiê, que depois serão transformados em palavras-chaves que representam os conceitos que serão traduzidos em elementos visuais. O resultado é um documento com o Resumo do DNA.

C e D. Inclusão do Estilo e do Tema

O Estilo e o Tema são responsáveis por fazer a ponte entre o DNA (abstrato) e os caminhos criativos (concreto). O Estilo define a identidade utilizando pólos semânticos (forte/fraco, natural/artificial etc) e o Tema serve como uma referência para construir os elementos visuais (o tema pode ser a natureza, a ciência, mitologia, história, arte, cultura popular etc.). O Resumo do DNA+estilo+tema são a plataforma para dar início à criação dos elementos de expressão visual da marca.

E. Geração de alternativas de caminhos criativos

Nessa fase, são exploradas diferentes soluções que reflitam visualmente os conceitos definidos no DNA, levando em consideração o estilo e tema que irão nortear o sistema de identidade. É importante lembrar que usando essa mesma base pode ser criada uma identidade sonora, olfativa, gustativa, tátil, além da visual.

A expressão da identidade se dá através de um processo associativo que acontece no cérebro, chamado pela psicologia cognitiva de «ativação por espalhamento» (spreading activation). Assim como uma pedra que cai no lago e gera ondas que se espalham, uma cor, uma forma, uma face tipográfica são capazes de ativar certas associações no cérebro com outros conceitos (um lugar, uma pessoa, um evento, uma emoção etc.). Outras teorias também oferecem explicação pra esse fenômeno, como o condicionamento clássico, inferência, metáfora experiencial, conotação, efeito aura, dentre outros.

F. Escolha interna do caminho adequado

Depois de gerar diferentes alternativas conceituais e visuais, é hora de escolher uma delas, para ser aprofundada e transformada em um Código Visual (elementos gráficos e regras de uso). O cliente deve ser envolvido nessa fase, se possível, para se detectar desde o começo algum caminho criativo inadequado. É mais barato corrigir uma falha aqui do que mais tarde no processo.

G. Desdobramento do caminho criativo (Construção do código visual)

Nessa fase, depois que o caminho criativo foi escolhido ele começa a se transformar em Código Visual. São definidos os elementos visuais, como os(as) logos, paleta de cores, texturas e padronagens (patterns), famílias tipográficas, avatares, personagens, grafismos e até os nomes que irão expressar a identidade (nos casos em que os nomes ainda não existirem). Além dos elementos, são definidas as regras de aplicação dos elementos nos pontos de contato. A união dos elementos com as regras formam o Código Visual propriamente dito.

H. Avaliação técnica e validação com partes interessadas

Essa é a prova de fogo dos elementos gráficos do sistema: eles devem ser avaliados usando uma lista de critérios de qualidade, como reprodutibilidade, permanência, suficiência, flexibilidade, proteção legal, dentre outros. O grau de dificuldade dessa escolha vai depender da complexidade do sistema de identidade. Em casos simples, menos critérios podem ser necessários. Essa escolha não precisa envolver o cliente, que pode ficar confuso diante de tantas informações e não tem condições de julgar usando critérios técnicos.

Na validação, o sistema de identidade é apresentado para as partes interessadas para se verificar quais são as impressões obtidas pelo sistema, qual o efeito sobre a imagem percebida. Neste momento é possível detectar falhas na expressão da identidade do ponto de vista cultural, conotações indesejadas e impacto negativo sobre a percepção. Essa etapa é imprescindível quando se trata de sistemas de identidade dirigidos a culturas diferentes ou em redesign de identidade (quando se corre o risco de afetar a imagem positiva herdada do sistema anterior).

I. Ajustes na identidade

Depois da prova de fogo (avaliação e validação) são feitos ajustes para corrigir possíveis falhas no Código Visual. Em alguns casos, pode ser preciso escolher um novo caminho criativo e recomeçar a construção dos elementos gráficos e regras de uso.

J. Aplicação dos elementos de identidade nos pontos de contato

Uma vez que o Código Visual esteja refinado e aprovado ele pode ser aplicado nos pontos de contato, que foram levantados previamente, na fase de Dossiê. É importante notar que alguns pontos de contato tem maior impacto do que outros, e eles merecem atenção especial. A teoria por trás desse conceito é chamada de «centrality effect» descrita por Anderson (1974) .

Tanto os elementos visuais, quanto as regras de uso e a aplicação nos pontos de contato devem ser registrados em um documento que pode ser físico (um caderno, um livro) ou virtual (um site, DVD, aplicativo).

K. Apresentação para partes interessadas

O lançamento é o evento oficial em que o novo sistema de identidade se torna público para as partes interessadas, relacionadas com a entidade. Existem muitos tipos de lançamento e a escolha do mais adequado vai depender dos objetivos estratégicos.

L. Encaminhamento para produção

Depois que o novo sistema de identidade visual é lançado, pode começar a aplicação dos novos elementos visuais e produção de novos materiais de comunicação, reforma de ambientes, sinalização de frota, troca de formulários etc. Parte desse processo (ou todo ele) pode acontecer antes do lançamento, no caso de entidades de pequeno e médio porte. Quando se trata de corporações globais ou eventos grande porte (como Olimpiadas), a implementação costuma ser gradual.

Essas etapas são apenas uma simplificação do processo. Ele pode ser muito mais complexo e envolver sub-etapas diferentes, conforme o tipo de entidade que irá receber a identidade visual (empresa, ONG, marca, embalagem, evento, cidade, país, website etc.).

Outro objetivo desse infográfico também é demonstrar como muitas discussões sobre construção de logos só focam na ponta do iceberg. O logo (destacado em vermelho no diagrama) é apenas uma parte de um processo mais amplo e detalhado, que contém outras etapas importantes. O logo sozinho não tem condições de fazer o papel que cabe a um sistema de identidade completo. Achar que um logo resolve por conta própria todos os problemas significa desconhecer o papel relevante da exploração, pesquisa, seleção, validação, revisão, documentação, lançamento e implementação de um SIV.

Um «desenho de logo» custa 195 reais? OK, deixe custar. Se o projeto é apenas de um desenho, desvinculado de todas as demais etapas de desenvolvimento da identidade, ele vai ser pura e simplesmente um desenho.

O que definitivamente não custa 195 reais é um sistema de identidade visual, e talvez com a ajuda desse infográfico seja mais fácil convencer seu cliente disso.

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Fontes bibliograficas:

  • Anderson, 1974  - O conceito de centralidade é explicado no livro Estética do Marketing, de Bernd Schmitt e Alex Simonson, da Editora Nobel.
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