Design é a adaptação criativa às restrições
Desde sempre o ser humano se adaptou e transformou dificuldades em oportunidades.
AutorRique Nitzsche Seguidores: 273
EdiçãoMarcio Dupont Seguidores: 70
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A pirâmide amarela faiscante era completamente irresistível. Linda. A enorme pilha estava descarregada no porto de Monte Dourado, a principal cidade do Projeto Jarí. Fascinado pelo grito da cor na selva do Pará, desci a rampa que me levaria à uma bela foto. Então, o vento mudou!
O odor do enxofre foi um radical nocaute nos sentidos. Em décimos de segundo, meus olhos se encheram de lágrimas e o pulmão, pernas e mente se paralisaram. No cérebro, um alerta de sobrevivência me fez voltar e rastejar lentamente ladeira acima. Foi a experiência mais aterrorizante da minha vida, até então.
Não é a toa que o enxofre é relacionado com o inferno. Os mineiros de enxofre catam o elemento puro com as mãos livres até hoje. Mas, como eles aguentam o intenso cheiro de coisa podre? Seus cérebros se adaptaram à necessidade. O nariz adormecido bloqueia o odor infernal.
A biologia sempre nos adaptou às restrições
Thomas Friedman escreveu sobre sua admiração por Taiwan. A ilha é «uma rocha nua em um mar repleto de tufões sem recursos naturais que lhe permitam sobreviver. Ela precisa importar até areia e cascalho da China para construção, mas tem a quarta maior reserva financeira do mundo. Porque em vez de escavar a terra, Taiwan cultiva seus 23 milhões de habitantes, seu talento, energia e inteligência».
Nós brasileiros temos também nossas ilhas extraordinárias. O Ciep Glauber Rocha, vizinho «a um reduto do tráfico, onde as taxas de homicídio superam em vinte vezes a média da Zona Sul» do Rio conquistou 8,5 no Ideb, o lugar mais alto do ranking do Rio de Janeiro e em segundo lugar no Brasil. Esse exemplo de superação tem uma responsável, Ioliris Paes Alves, na administração da escola há 17 anos, engajando os pais dos alunos, cultivando a leitura, organizando o currículo e incentivando os professores.
Outra ilha de excelência é a pequena Paulista, uma cidade do alto sertão da Paraíba onde não chove desde outubro de 2011. Lá, no interior semiárido, a maestrina é a professora Jonilda Alves Ferreira. Sua pequena turma de alunos conquistou na Olimpíada de Matemática de 2012 incríveis 22 prêmios. Onde Jonilda achou tantos talentos? O número de habitantes de Paulista é 3,5 menor do que a capacidade do menor estádio da Copa do Mundo de 2014, em Curitiba. Pois nessa concentração de restrições, Jonilda consegue ser uma fonte de energia que transborda a sua sala de aula e invade a sua apertada sala de estar, onde dá aulas de reforço grátis para quem quiser.
Por último, a Associação Di Thiene, em São Caetano do Sul, onde Marcos Goto treina o campeão olímpico de ginástica Arthur Zanetti. O abafado ginásio com goteiras não oferece equipamentos adequados e suficientes. Os poucos que existem estão avariados. Foi lá, nessa ilha de restrições, que o atleta se preparou sem patrocinador e sem qualquer apoio da Confederação Brasileira de Ginástica. A medalha de ouro olímpica deve ter um brilho especial para ambos.
«Mentes criativas são conhecidas por resistirem a todo tipo de maus tratos». Anna Freud
A diferença fundamental é que as nossas ilhas foram inseminadas pelo talento de poucos dedicados. A oriental Taiwan é o resultado de uma cultura que não depende de abnegados isolados, mas de um permanente processo coletivo.
A Inglaterra de Tony Blair gerou um movimento chamado «Cool Britannia», um movimento de re-posicionamento estratégico do Reino Unido no cenário global. Com início em meados da década de 90, essa re-orientação das indústrias criativas produziu uma nova geração de empreendedores.
Pela pobre herança dos políticos brasileiros, não devemos esperar que o governo assuma um papel semelhante. Pelo conservadorismo do nosso empresariado não seria prudente esperar que as tradicionais empresas invistam na indústria criativa como solução para o impasse econômico.
Os brasileiros e os sul-americanos deveriam assumir coletivamente as imensas restrições do continente para gerar uma cultura permanente de inovação reversa, que Vijay Govindarajan tanto defende. Somos capazes disso. Afinal, os brasileiros recriaram gloriosamente o Carnaval, uma experiência coletiva que falava grego antes de Cristo. Agora, temos a web para reverberar a nossa voz criativa.
Design é a capacidade de tornar tangível uma intenção de transformação
Vamos então empreender uma fraterna colaboração. Se precisarmos de uma ferramenta para facilitar a criatividade grupal, experimentem o design thinking e vamos ser felizes juntos. O design thinking é uma metodologia desenvolvida para resolver problemas complexos de forma empática, interdisciplinar, colaborativa e centrada na diversidade humana. A sua prática abre a cabeça, incentiva os sentidos, enfrenta os limites e foca na solução dos problemas.
O Brasil «deitado eternamente em berço esplêndido» quer se levantar e clama por uma nova geração de inovadores. Vamos inventar um novo futuro brasileiro que supere as restrições com ousadia, criatividade, irreverência e descontração.
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