Como vender design?
Quando o conceito de cliente não é claro, surgem dificuldades em desenvolver competências de gestão que orientem de forma adequada o projeto profissional.
AutorFernando Del Vecchio Seguidores: 819
TraduçãoAlvaro Sousa Seguidores: 16
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Na sequência do concurso de cartazes " La mirada de Nosotros - Latinoamérica Hoy» («A visão de nós próprios – America latina hoje»)1, o segundo prémio na categoria Profissionais – avaliado pelos membros do Fórum de Escolas de Design –, foi dado ao trabalho que aqui se apresenta:
Uma das coisas que me chamou à atenção nos comentários de quem apreciava a peça – todos eles jovens designers –, foi o fato de ser rirem por acharem que o cartaz os «representa tal qual como são».
Por não ser designer, mas me ter especializado no desenvolvimento de capacidades empreendedoras e de gestão, para além de trabalhar com muitos designers, esta situação levou-me a ter em atenção aquilo que denomino de «orientação da atividade profissional do designer». Clarificando o pensamento, comecei a observar com mais atenção a forma como o designer se relaciona com a envolvente (os seus clientes)2 a partir da maneira como pensa a sua profissão e a sua relação com a envolvência.
De forma surpreendente, para mim, a grande maioria dos designers (predominantemente jovens, estudantes finalistas ou recém-licenciados) expressavam a necessidade de desenvolver a criatividade como resposta aos pedidos dos clientes. Já uma minoria (designers com anos de experiência) expressavam isto como um desejo, embora entendessem que o mais importante fosse atenderem ao pedido do cliente e só depois, se possível, ao seu lado criativo, não sendo esta uma condição básica de realização pessoal no trabalho.
É possível que o que marca a mudança – de uma orientação centrípeta para uma centrífuga – na atitude na orientação do trabalho do designer seja a experiência (ou o cansaço de se relacionar com um certo tipo de clientes), estabelecendo-se a seguinte classificação:
Orientação centrípeta (do cliente para o designer)
O designer expressa a necessidade de ser compreendido pelo cliente, apelando à sua intenção de fazer prevalecer os seus critérios estéticos ou a sua criatividade sobre o pedido do cliente, negando-o se for necessário. Nesta forma de trabalhar, a necessidade a ser satisfeita é a do designer; a criatividade ou a estética devem prevalecer por cima daquilo que o cliente solicitou. O cliente converte-se, na opinião do designer, numa espécie de obstáculo porque não compreende o criativo.3
Neste caso, a necessidade do designer (o QUE) deve ser satisfeita através do pedido do cliente (o COMO).
Como exemplo, podemos ver o 21º episódio da 7 ª temporada do "Seinfeld". Jerry Seinfeld leva o seu carro ao mecânico para a mudança de óleo e revisão. A situação torna-se hilariante devido à forma como o mecânico o aborda e ao tratamento exagerado a ter com o carro que quase exige a Jerry (de acordo com a necessidade e a vontade do mecânico e não com o uso e cuidados que o cliente pode e quer dar ao seu automóvel).
Orientação centrífuga (do designer para o cliente)
O designer percebe a sua profissão como um serviço, sendo o cliente quem lhe faz um pedido. Nas palavras de Belluccia:4
O designer gráfico trabalha para que o seu cliente comunique melhor com o seu público porque o bom designer gráfico é um especialista em códigos de comunicação.
Neste caso, a necessidade satisfeita é a do cliente,5 apesar da criatividade (e outras capacidades) do designer ser entendida como um «COMO».
Em suma, quando o designer quer que o cliente, através da sua contratação, satisfaça a sua própria necessidade de realização – o QUE – o importante é a criatividade (e os seus critérios estéticos, etc.). Quando o designer entende a sua profissão como um serviço ao cliente, a criatividade converte-se em COMO.
A postura do designer perante a sua atividade (QUE necessidade resolver e COMO a resolver), é parte de um complexo sistema de variáveis que determina, consequentemente, os problemas e conflitos a que atualmente os designers estão sujeitos.6
Alterar a orientação do projeto – desde a atenção às necessidades do cliente, até trabalhar sobre as necessidades do mesmo – reorienta a gestão do trabalho do designer (seja no caso dos designers que trabalham por conta própria ou em associação, ou no caso dos que trabalham em ateliers ou agências), começando a desenvolver, em alguns casos de forma natural, algumas aptidões de gestão.
Se considerarmos que a grande maioria dos designers aspira a trabalhar por conta própria e não numa relação de dependência,7 a aquisição e desenvolvimento de competências de gestão, como complemento do seu próprio talento, torna-se essencial.
Então... como vender design?
Se conseguíssemos entender esta orientação apresentada ao cliente como natural e necessária para o desenvolvimento da profissão, oferecendo uma proposta de serviço que conviesse a quem a solicitasse, precisaríamos primeiro de entender a que tipo de necessidade ou desejo atenderíamos. Neste sentido, a questão "como posso eu vender design?"8 torna-se inadequada.9
A pergunta a colocar não é «como é que posso vender design?», mas antes «que problemas ou dificuldades podem as minhas competências resolver?», ou então «qual é o problema (do cliente) que vem solicitar os meus serviços?», para entender «que necessidade ou desejo devo satisfazer?».
Segundo a opinião de Theodore Levitt em Marketing Myopia,10 a venda concentra-se nas necessidades do vendedor enquanto que o marketing nas necessidades do comprador. A venda é obcecada com a necessidade que o vendedor tem de converter o seu produto em dinheiro ao passo que o objetivo do marketing é o de responder às necessidades dos clientes com produtos (e todo um conjunto de coisas associadas à sua criação), entrega e consumo final.
Conclusão
Os problemas que os designers reportam na sua relação com os clientes e prática profissional, são o resultado de um modelo mental,11 ou seja, uma forma muito particular de entender a razão de ser do design como serviço.12
Se integrarmos conhecimento e perspectivas analíticas oriundas de outras disciplinas, é possível rever os pressupostos13 sobre os quais assenta hoje a prática profissional e abrir novos caminhos para alterar esta realidade deturpada.
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Bibliografía
- Belluccia, R. (2007) «El diseño gráfico y su enseñanza. Ilusiones y desengaños», Buenos Aires, Editorial Paidós.
- Del Vecchio, F. (2008) «Causas Estructurales Determinantes de Patrones de Problemas en la Gestión de Estudios de Diseño. Proyecto de tesis doctoral no publicado», Universidad del CEMA, Buenos Aires, Argentina.
- Kotler, P. (2001) «Dirección de Marketing. La edición del milenio», México, Pearson Educación.
- Senge, P. (1992) «La quinta disciplina. Cómo impulsar el aprendizaje en la organización inteligente», Barcelona, Ediciones Juan Granica.
- Encontros Latinoamericanos de Design em Palermo, Buenos Aires, 2007.
- Este artigo fala de «cliente» e não de «encomenda», ao contrário de muitos artigos de design que falam da atividade profissional. Talvez a idéia de cliente tenha sido substituída pelo desagrado do designer para discutir questões e usar palavras relacionadas com o conceito «negócio».
- «Um designer que acredita que é o cliente que tem de o entender deveria voltar para o Jardim de Infância e recomeçar tudo de novo […] é o designer quem se deve esforçar por compreender a necessidade do cliente e não o inverso, pois é para isso que ele é contratado». Belluccia (2007), P. 48/9.
- Belluccia (2007), P. 63.
- «O conceito de marketing sustenta-se em quatro pilares: mercado, necessidades do cliente, marketing integrado e rentabilidade. […] O conceito de marketing […] começa com um mercado bem definido, concentrando-se nas necessidades dos clientes, coordenado todas as atividades que afetarão os mesmos e gera lucros que satisfazem os clientes». Kotler (2001), P. 19/20.
- Esta orientação é um modelo mental que determina a forma como pensamos a atividade profissional e determina o que fazemos. Para ampliar, ver: Senge, P. (1992). La quinta disciplina. Cómo impulsar el aprendizaje en la organización inteligente. Barcelona: Ediciones Juan Granica.
- De acordo com o «Primeiro recenseamento de apoximação à realidade do mercado de design argentino» (Programa Pro Design Argentino, 2005-2006), 95,8% dos estudantes de cursos de especialização e universitários questionados (das distintas disciplinas do design argentino) projetam o seu futuro como como profissionais independentes. Citado em: Spina, M. (2007). Casos de emprendedores en el diseño. Buenos Aires: Red Argenta.
- «Design é o nome de uma profissão ou especialidade cuja finalidade consiste em definir, antes do fabrico, as características finais de um produto, para que este cumpra os objetivos predeterminados». Belluccia (2007), P. 11.
- Esta forma de considerar o problema é tão inadequado como se eu quisesse vender a minha capacidade de pensar em modelos de negócios inovadores e o comunicasse nestes termos. Seria diferente se a minha aptidão, colocada ao serviço ao cliente, promovesse, desenvolvesse e implementasse um modelo de negócio inovador que fosse do seu interesse.
- Kotler (2001), P. 19.
- «Os "modelos mentais" são pressupostos profundamente arraigados, generalizações e imagens que influenciam o nosso modo de comprender o mundo e atuar». Senge (1992), P. 17.
- «para obter resultados diferentes (no modelo operativo onde opera o designer gráfico), é necessária uma discrepância entre o modelo de negócio (a configuração da sua atividade) e o modelo mental (crenças sobre o que impulsiona o êxito no setor). Onde é que se gera essa discrepância? A partir do modelo político (aqui considerado como o fator que limita, principal restrição do sistema ou o ponto de alavancagem), nas ligações do setor com o poder, a autoridade e a influência necessária para "impor" diferentes modelos mentais». Del Vecchio (2008), P. 33.
- Ver debates: «¿Qué es el diseño?» e «El diseño ¿tiene fines propios?»
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