Olhares gráficos: design, conceito e identidade visual
A utilização do olho no logo da «CBS Television» e em outras empresas que dele se utilizam como elemento gráfico em suas marcas.
AutorBeto Lima Seguidores: 14
EdiçãoMarcio Dupont Seguidores: 70
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«O ser humano pensa visualmente. As imagens agem diretamente sobre a perceção do cérebro, impressionando primeiro para serem, depois, analisadas, ao contrário do que acontece com as palavras».
Vivemos em uma sociedade em que a informação se caracteriza pelo tratamento predominantemente visual. Imersos na ambiência tecnológica hipermoderna, às voltas com cenários urbanos semioticamente complexos, dependemos, cada vez mais da visão para melhor assimilar (e incrementar) as regras de funcionamento do atual modelo civilizacional.
Independentemente de acreditarmos ou não em «amor à primeira vista», sabemos o quanto as primeiras imagens das coisas e das pessoas permanecem em nossas memórias. Basta nos sentarmos em uma mesa de bar, à beira de uma rua movimentada e observar os transeuntes − seus semblantes, posturas, modos de andar e roupas – para pressupor que sabemos um pouco sobre cada um.
Assim como costumamos fazer julgamentos sobre os outros, baseados apenas em alguns dados visuais, igualmente estabelecemos juízos de valor para os negócios e para os produtos. Na maioria das vezes, embora nem cheguemos a ter com estes uma relação direta de consumo, os classificamos, segundo se nos apresentam aos olhos. Daí a importância de que as primeiras imagens sejam, adequadamente, processadas para que nos comuniquem o que deve ser comunicado, fixando-se, positiva e consistentemente, em nossas mentes.
Para Peter Burke,1 as imagens, antes de serem o reflexo direto da realidade ou um sistema de signos independente, ocupariam posições variáveis entre estes dois extremos, cabendo ao historiador posicioná-las, da melhor maneira possível, ciente de seus potenciais e limitações. Desse modo, os testemunhos visuais do passado se reforçariam em seu caminho rumo à porta da frente da historiografia, num processo mediado pelo diálogo interdisciplinar – o grande diferencial de uma história cultural a ser construída a partir da revisitação das fontes e das teorias.
Já para Gilles Deleuze,2 no que diz respeito à contemporaneidade, a denominação «civilização do clichê» seria mais adequada do que «civilização da imagem», por se referir tanto à inflação icônica assentada na redundância informacional quanto à ocultação, distorção ou manipulação de determinadas imagens que, em vez de servirem para o descortino da realidade, se prestariam melhor a ocultá-la.
Abraçando a hipótese de que toda linguagem icônica resultaria de uma estratégia significativa e, como tal, persuasiva, esse artigo se propõe a analisar os «olhares gráficos» encontrados em algumas marcas desenvolvidas por designers para clientes de perfis diferenciados, mas que possuem em comum a utilização do olho como tema e/ou objeto central de sua concepção.
Uma marca pode ser definida como a soma intangível dos atributos de um produto e/ou serviço, a saber, seu nome, embalagem e preço, assim como a história, a reputação e a maneira pela qual é promovido.
A história das marcas é, ao mesmo tempo, antiga e recente. De forma embrionária, observa-se a sua utilização desde a Antiguidade em atividades que envolvem a fabricação e a troca de mercadorias. No entanto, só com a Revolução Industrial e, notadamente, a partir da segunda metade do século XIX, é que as formas modernas de marca fizeram sua aparição mais notória. Um século depois, a eclosão do consumo de massa operou uma transformação na lógica de seu funcionamento, dinamizado como nunca pelos meios de comunicação.
É claro que uma boa imagem por si só não basta para que um produto ou um serviço seja bem sucedido. Faz-se, sobretudo, necessária a qualidade do que se vende. Um consumidor que teve uma experiência negativa com uma marca, decerto tenderá a não adquirir outros produtos e serviços a ela relacionados, uma vez que uma expectativa foi quebrada, independentemente da «assinatura» atrás dela ter ou não sido bem projetada.
Foi em tal contexto que algumas emissoras de televisão ganharam destaque, ao procurarem agregar valor ao conteúdo que se propunham transmitir, mediante a utilização de signos de fácil assimilação por parte dos telespectadores. São justamente algumas dessas iniciativas que nos propomos analisar agora, no caso, a utilização temática do olho em marcas de mídia televisiva e em outros segmentos.
A marca da CBS Company, uma das maiores empresas televisivas norte-americanas foi assinada, em 1951, pelo designer William Golden. A primeira vinheta desenvolvida pela empresa foi concebida a partir de vários olhos concêntricos . A câmera mostrava uma pupila como o diafragma de uma máquina fotográfica que se abria para mostrar a identificação da emissora e, em seguida, se fechava.
Sua função não era tanto diferenciar a CBS das demais emissoras, quanto demarcar seu espaço de atuação no próprio sistema de comunicação. Ele foi desenhado quando a empresa fundou a Rádio e o Sistema de Televisão como duas divisões que não mediriam esforços para construir, separadamente, suas próprias identidades. À época, a audiência estava crescendo muito rapidamente e, com mais e mais olhos focados nas telas, todos começavam a se interessar pelo padrão de qualidade das imagens televisionadas.
William Golden tinha submetido três padrões visuais de identificação para uma dúzia ou mais de pessoas diretamente ligadas às transmissões originais e não podia prever que um deles pudesse ser recebido com entusiasmo pelo grupo. Mas a reação de uma delas acabou sendo decisiva. Tratava-se de Frank Stanton, o futuro presidente da própria CBS.
Per Mollerup, ao abordar a taxionomia das marcas em Marks of excellence: The history and taxonomy of trademarks, reservou a segunda parte do livro aos temas que costumam ser recorrentes, entre eles o do olho. Ali descreve outros olhos utilizados em marcas de várias empresas: o sol, os deuses, a ciência infinita, uma divindade que tudo vê, a luz, o esclarecimento, o conhecimento, a mente, a vigilância e a proteção são alguns dos significados simbólicos que têm sido com ele relacionados.
Abaixo, vários cases de logos com a utilização do olho como tema:
Vemos, portanto, sem trocadilhos, que as imagens das empresas e das instituições experimentaram um significativo processo evolutivo e que, em alguns casos, há uma redundância na questão do significado de suas identidades, pois seus signos quase que se repetem a ponto de se generalizarem, banalizando, até certo ponto, seus marcos iniciais. Cada vez mais fica difícil construir uma proposta inovadora de identidade de marca através do estabelecimento de imagens, percepções e associações pelas quais os diferentes públicos irão se relacionar com um produto, um serviço ou uma empresa.
Pois é justamente essa sinestesia, essa capacidade de levar o leitor e o telespectador a associar logotipos a um pensamento visual, que tem sido almejada desde sempre pela TV e, há muitos anos, pela mídia impressa. Resta saber como isso se dará daqui por diante, já que se vive em uma sociedade com desejos cada vez mais flutuantes, como costumava dizer Alvin Toffler. Resta saber, portanto, que capacidade terão os mass media, por meio de seus logos, para satisfazer tais vontades.
Todos esses movimentos têm seu espaço no vídeo, na imagem eletrônica. O vídeo assimila todas as outras imagens, permite a passagem entre os suportes, a transição entre a pintura, a fotografia e o cinema.3
E, completando a assertiva acima, poderíamos dizer que a referida transição também envolve a linguagem poética, hoje assimilada pelo vídeo e pelos sites na internet, como, por exemplo, na poesia multimídia, que integra palavras em movimento aos gestos, imagens, sons, cores e ritmos, num processo intersemiótico de efeitos sempre surpreendentes.
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- P. Burke. Testemunha ocular: história e imagem.
- G.Deleuze. Cinema 2 – A imagem-tempo.
- Peixoto apud Parente, 1996, p. 243.
Co-autor: Jorge Lucio de Campos – Doutor e Pós-Doutor em Comunicação e Cultura (História dos Sistemas de Pensamento) pela UFRJ (1996). Mestre em Filosofia (Estética) pela UFRJ (1988). Graduado em Filosofia pela UFRJ (1981). Professor do Programa de Pós-graduação (Mestrado) em Design da ESDI/UERJ.
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