Design thinking: modismo ou método útil?

Uma análise equilibrada sobre os prós e contras do movimento que é a nova febre na gestão de projetos e de empresas.

Ricardo Martins, autor AutorRicardo Martins Seguidores: 86

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Este texto se baseia em parte nas ideias do artigo de Lee Vinsel. O objetivo não é criticar os métodos legítimos sugeridos por designers mas sim o uso deles motivado por uma febre passageira.

«Se todos estão pensando da mesma forma, é sinal de que alguém não está pensando».

General G. Patton

As organizações já passaram por vários modismos. Num artigo publicado em 1994, já se falava sobre as diferentes ondas que atingiam as empresas, prometendo ser a solução para os seus males:

É chocante verificar a sucessão de novas modas na gestão empresarial desde os anos 50. Primeiro surgiu a Pesquisa Operacional (PO), depois o Controle de Gestão e a Gerência por Objetivos (GPO), nos anos 60; em seguida, o Desenvolvimento Organizacional (DO) de 1965 a 75 e o Enriquecimento de Tarefas, na década de 70. A partir de 1980, os Círculos de Qualidade (CQ), a Qualidade Total e o Just-in-Time tomaram a dianteira.

Além desses modismos, ainda podemos citar outros movimentos que já foram uma febre:

  • Reengenharia de processo de negócios (RPN)
  • Kaizen
  • Custeio baseado em atividade (CBA)
  • Gestão do conhecimento
  • Responsabilidade Social Empresarial
  • Sustentabilidade

O movimento que está na moda no momento tem nome e sobrenome: Design Thinking (DT).

Não se sabe ao certo onde ele começou, mas suas origens podem estar no trabalho do polímata Herbert Simon e do designer Robert McKim. O termo também foi popularizado a partir do título do livro de Peter Rowe Design Thinking, publicado em 1987. Rowe foi líder do Programa de Pós-Graduação em Design, da Universidade de Harvard (1992–2004). E o conceito também foi fortemente disseminado pela consultoria IDEO. Mais recentemente, ele foi difundido com grande visibilidade pela d.school, escola de design de Stanford. Por 12.600 dólares (R$ 41.400) você pode fazer um workshop de 4 dias chamado «Dos Insights até a Inovação», que se baseia nos princípios do DT.

Que benefícios as pessoas buscam no Design Thinking?

De maneira simples, elas procuram as estratégias criativas que os designers utilizam no seu dia-a-dia, para resolver problemas de muitos tipos, desde problemas corporativos até sociais. Recentemente tem se sugerido usar o design thinking para resolver até problemas educacionais.

As vantagens mais valorizadas no Design Thinking são:

  • Descobrir o que as pessoas realmente precisam ou valorizam
  • Descobrir quais fatores do ambiente externo afetam os projetos
  • Entender de maneira simplificada e antecipada como um produto ou serviço irá funcionar ou se ele irá ser aceito pelas pessoas
  • Encarar o erro de forma positiva

Embora essas virtudes pareçam ser desejáveis e relevantes para muitas organizações, o Design Thinking tem um problema que não está na sua essência mas nas origens desse movimento e na forma como ele está sendo praticado.

Temos que ser honestos: um movimento que permite à Universidade de Stanford vender cursos de 4 dias por R$ 41 mil reais pode não ser tão «bem-intencionado» assim.

O próprio começo da escola de design de Stanford, maior defensora do DT no mundo, dá muito o que pensar. Muitos dos membros da comunidade de Stanford, incluindo os precursores da d.school, frequentavam um movimento chamado de Human Potential Movement, numa entidade chamada Esalen. Na própria página dela, ela se descreve como sendo:

«Nem uma escola, nem uma igreja, ​nem um spa, nem um hotel, nem um monastério… e ainda uma completa mistura inigualável que contem um pouco de tudo isso».

A Esalen é uma entidade que defende o pleno desenvolvimento humano se apoiando em referências como Abraham Maslow e Gestalt, duas abordagens que já sabemos que são bem questionáveis. Foi na Esalen que a d.school se inspirou para defender dois valores centrais do Design Thinking: criatividade e empatia. E foi na d.school que David Kelly obteve seu mestrado em design, antes de criar a IDEO em 1978. Em 2005, Kelly pediu ajuda para Hasso Plattner (um bilionário da indústria de software) para conseguir criar a d.school. O pedido deu certo e ele obteve 35 milhões de dólares (115 milhões de reais) para construir a escola.

O fato é que a d.school se tornou um sucesso e atraiu milhares de alunos, que ajudaram a disseminar o DT através do mundo. No seu artigo «Is Design Thinking the new liberal arts?», Peter Miller alega que esse número de matrículas sugerem que o que quer que seja que a d.school está fazendo, está funcionando. Mas podemos raciocinar: o fato de algo ser muito difundido ou conhecido o torna necessariamente bom?

O fato é que o DT coloca conceitos antigos dentro de uma nova embalagem. Conhecer as necessidades das pessoas, agora se chama Empatia (escrevi um texto em 2007 falando sobre o conceito de «centro no usuário» que já era moda naquele tempo).

Esse modo defendido pelo DT, chamado de «Empatia» afirma usar a abordagem etnográfica da Antropologia, o que é praticamente uma ofensa a Antropologistas Culturais. Poucos deles concordariam que um workshop de dois dias sobre DT consegue habilitar pessoas a usarem «etnografia».

Natasha Jen, designer da Pentagram, numa conferencia em junho de 2017, afirma que o DT se tornou uma expressão da moda que não tem sentido. Segundo ela, «muitos design thinkers tratam o design como um processo simples, linear, uma sequencia de cinco passos representados como hexágonos». Além disso, Jen afirma que o que falta é um pensamento crítico que sempre foi uma característica comum dos designers, antes mesmo dessa moda.

Jen afirma ainda que há poucos exemplos de casos onde o DT foi responsável pelo sucesso do projeto. Ela afirma com todas as letras: «Se o Design Thinking é tão bom, então prove». Ela também resiste à ideia de que «um único método pode lidar com qualquer tipo de situação».

Len Vinsel fez uma pesquisa com professores e ex-alunos das melhores faculdades de design e arquitetura dos EUA, e chegou à conclusão de que a maioria dos entrevistados nunca usou o termo Design Thinking. O termo é mais conhecido com universidades de segundo e terceiro nível que não estão inovando mas apenas «copiando» Stanford.

Muitas escolas de design estão criando cursos «light» de Design Thinking. Neste caso os estudantes não são especialistas em nada, e os projetos assumem a forma de «crianças tentando salvar o mundo». Nestes casos o Design Thinking dá aos estudantes uma ideia irreal sobre o que seja o design e como se cria mudanças positivas. Os design thinkers dão aos estudantes um poder, mas sem o conhecimento necessário.

Lee Vinsel afirma ainda que os design thinkers lubrificaram os sonhos dos «inovadores sociais» dando a impressão de que habilidades políticas são desnecessárias e não há conflitos nas organizações, ao implementar os projetos.

«Algumas iniciativas que defendem o DT se parecem com um tipo de doutrina em um culto, incluindo períodos de alta emoção, criando palavras técnicas, que são difíceis de entender para quem está de fora, e dizendo aos membros que eles são diferentes e melhores do que outros (no caso, os outros que não praticam o DT)».

Vinsel

Vinsel diz que quando pessoas demonstram discordar dos paradigmas e conceitos do Design Thinking, os praticantes desse movimento olham para elas como se fossem obstáculos no caminho dos designers. Os que não seguem o DT são como retardatários (em inglês, «laggards»). Isso parece com a relação entre adolescentes e seus pais, onde os jovens acham que os pais são velhos e ficam no meio do caminho. Até o momento em que você cresce e descobre que outras pessoas tem bastante a ensinar, mesmo quando – e especialmente quando – eles discordam de você.

Algumas organizações podem se resistentes à mudanças propostas por «design thinkers», não porque simplesmente resistem a qualquer mudança, mas porque a ideia é simplesmente medíocre, incompleta e superficial.

Conclusão

Portanto nota-se que o movimento a favor do Design Thinking embora possa ter seu lado «virtuoso» também vem acompanhado de problemas. O DT tem mostrado ser um modismo que está sendo amplamente aceito, mas que merece ser avaliado de modo imparcial.

No livro Facing Up to Management Faddism, Margaret Brindle e Peter Stearns explicam que os modismos entram nas empresas em momentos de crise percebida, e as modinhas cumprem certas funções entre os líderes das organizações:

  1. Aliviam as preocupações pois essa «novidade» promete resolver os problemas
  2. Legitimam a organização porque consegue mostrar que ela está em dia com as novidades legais que surgiram
  3. Habilita os líderes a mostrarem que estão fazendo alguma coisa
  4. Seguir a modinha ajuda a pessoa a progredir na carreira e ganhar o respeito por seguir o que é mais atual

Nesse sentido, seguir a moda do DT pode servir mais como um esforço para se auto-afirmar e «seguir a manada» do que de fato para conquistar as mudanças que são necessárias para a organização.

Quero deixar bem claro que existe uma diferença entre utilizar métodos legítimos para descobrir e atender as necessidades humanas e usar os mesmos métodos apenas para dizer que usou e que está seguindo a nova moda. Os métodos que o design utiliza são bem mais antigos que o próprio design e tem seu valor reconhecido. Podemos citar dentre estes: pesquisas, prototipação, validação de conceitos, planos de ação, priorização de problemas, etc. Portanto, esse artigo não se posiciona contra esses métodos, mas sim contra o emprego deles motivado por um modismo inconsequente.

Discordar do design thinking como modismo não é apenas nadar contra a corrente, mas representa uma oportunidade para aprimorá-lo, tirá-lo do seu pedestal, corrigir suas falhas e encontrar um caminho que não atenda em primeiro lugar os interesses comerciais de consultorias, mas que de fato coloque o homem como centro das coisas, de forma genuína.

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