Empatia e design na evolução humana
Empatia é o primeiro atributo que um designer deve possuir.
AutorRique Nitzsche Seguidores: 273
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Gerar objetos através do design é uma habilidade pré-humana. Macacos usam ferramentas para retirar formigas do solo para se alimentar. O primatologista William C. McGrew demonstra que os «kits de ferramentas» dos chimpanzés já possuem 20 itens notórios. McGrew menciona casualmente que eles são usados para «diversas funções na vida cotidiana, incluindo subsistência, sociabilidade, sexo e autopreservação». Em meados de 2011, Victoria Horner, do Centro de Pesquisa Nacional de Primatas Yerkes, revelou que as fêmeas dos chimpanzés são altruístas e empáticas com seus filhotes e outras fêmeas, preferindo compatilhar alimento. Frans de Waal, famoso pioneiro no estudo das emoções nos primatas, propõe que a empatia é um comportamento instintivo de sobrevivência dos mamíferos, no seu recente livro A Era da Empatia.
Empatia é uma palavra bastante usada pela imprensa na descrição de uma intensa interatividade emocional entre um artista no palco e a plateia entusiasmada. A arte, assim como o design, é um canal no qual a empatia frequentemente se manifesta. No início do século XX, Theodor Lipps, um filósofo alemão, criou a palavra empatia para definir a projeção emocional que um espectador desenvolve diante de uma obra de arte. O estado de empatia seria a capacidade de colocar-se no lugar do outro e sentir os componentes emocionais dessa transposição, no caso através da arte.
«Quando assisto a um acrobata andando sobre uma corda bamba, sinto-me nela». Theodor Lipps, 1903.
Nos dias de hoje, um intenso exemplo de empatia é a ligação afetiva que os telespectadores têm com os personagens das novelas de TV. Mesmo sabendo ser ficção, o público desenvolve uma interação ativa entre a realidade do dia a dia e a imaginação do autor. São inúmeros os casos de atores xingados ou agredidos nas ruas por representarem papéis de protagonistas malvados, rudes ou agressivos. Um caso de empatia histórica no Brasil foi o enterro de um personagem de novela que era um sucesso na época. A locação externa das cenas do enterro do personagem foi em um cemitério real. Uma multidão inesperada compareceu ao cemitério, transformando as tomadas de cena em uma performance emocional radical, tanto para os chorosos espectadores presentes como para os atores e técnicos da novela envolvidos pela experiência. Foi uma comoção grupal que fundiu verdade e fantasia.
Alguém que entende de empatia é o autor de novelas Agnaldo Silva. Ele sabe que seus personagens fictícios devem ter empatia com os telespectadores anônimos. Ele consegue encantar seu público, porque o conhece. Agnaldo gosta de observar «pessoas comuns em situações comuns», mesmo que tenha que se mudar de bairro ou cidade para poder investigar melhor. A metodologia do design thinking chama isso de imersão no problema.
Os super-heróis da Marvel têm um segredo a proteger. Seu criador mor, Stan Lee, afirmava que o seu sucesso era a preocupação constante em estar sempre próximo da vida dos leitores. Seus protagonistas não eram super-criaturas vivendo em cidades de fantasia. Eram seres especiais que frequentavam as mesmas cidades dos humanos comuns, sofrendo as mesmas dúvidas existenciais das pessoas anônimas. Assim, a Marvel se preocupava em promover uma relação empática com seus leitores, criando um grau de identificação maior do que seus concorrentes.
«Empatia envolve a experiência interior de compartilhar e compreender o estado psicológico momentâneo de outra pessoa». Roy Schafer, psicólogo e psicanalista, 1959.
Estudos recentes associam o uso intenso da rede social com a falta de empatia e a depressão na adolescência. A plataforma da rede social cria uma vitrine de alta exposição que alimenta a baixa autoestima dos narcisistas que, por sua vez, usam a rede para incentivar esse transtorno de personalidade. Ao mesmo tempo, a rede serve de refúgio ao alimentar os relacionamentos pessoais sem expor os jovens ao contato presencial que acontece na vida real. As redes sociais serviriam, então, como vitrine de vaidade, filtro separador de contato pessoal, liquidificador cultural, dispersor de concentração.
Dev Patnaik, autor do livro Wired to Care, afirma que as empresas prosperam quando atingem um poder que cada ser humano já possui, a capacidade de sairmos de nós mesmos para nos conectar com outras pessoas, quando calçamos os sapatos de uma outra pessoa para melhor entender a vida. Patnaik, que é consultor estratégico, diz que uma grande falha na prática empresarial contemporânea é a falta de empatia nas grandes corporações.
Jeremy Rifkin, autor de The Empathic Civilization, defende a tese de que a humanidade entrou na Idade da Empatia, quando a nova geração entende que o mundo é feito de partilha e cooperação e vive em uma dimensão descentralizada, interconectada e sem hierarquia, fazendo emergir um contagiante sentido de urgência de solidariedade. Daniel Pink, autor do best-seller A Whole New Mind, nos apresenta a Era Conceitual, na qual teremos que aprender a usar os dois lados do cérebro. Sua pesquisa indica seis sentidos que irão nos ajudar a conviver em um mundo mais conectado. Para Pink, a empatia é uma habilidade de compreender o comportamento dos nossos semelhantes, de estabelecer relacionamentos e de se preocupar com os outros. Empatia seria uma capacidade complementar à lógica em uma civilização de informação desconexa abundante.
«Nós acreditamos que a empatia é uma chave para a inovação». Doug Bazuin, pesquisador sênior da Herman Miller, 2011.
Inspiradas em mercados mais desenvolvidos, algumas empresas brasileiras estão escolhendo contratar pessoas mais maduras para determinadas funções nos ramos de transportes, hotelaria, segurança, educação, limpeza, vendas imobiliárias e saúde. Funcionários mais velhos transmitem empatia e uma sensação de segurança nos trabalhos que exigem contato direto com o público. Pessoas com mais de 40 anos têm mais empatia com os usuários dos serviços oferecidos. Elas dão dicas, trocam experiências e ajudam os outros no processo de construir uma fidelidade mais autêntica às empresas.
O psicólogo Daniel Goleman escreveu o best-seller Inteligência Emocional, no qual ele oferece a sua teoria sobre as pessoas que possuem um alto grau de Quociente Emocional. A chave do sucesso pessoal dessas pessoas deve-se a cinco mandamentos. Entre eles a empatia, «a habilidade de se colocar no lugar do outro, de entender esse outro e de perceber sentimentos não-verbalizados num grupo».
Jack Welch já abordou esse tema. Em um mundo de negócios cada vez mais globalizado, empatia vai além de cordialidade e compaixão. Trata-se de entender e respeitar pessoas e culturas diferentes, aceitando seus valores e tradições. Na sua opinião, a pouca prática da empatia abalou o desenvolvimento das negociações entre a IBM e a companhia chinesa Lenovo. Os executivos da IBM tiveram que aprender e praticar a empatia para conseguir interagir melhor com os orientais. O consultor americano Stephen R. Covey, autor de Os Sete Hábitos das Pessoas Muito Eficazes, diz que os hábitos de interdependência, empatia e sinergia representam uma forma de lidar com questões difíceis e continuar mantendo bons relacionamentos de trabalho. Para Covey, empatia serviria para combater relacionamentos tensos que se cristalizam em males crônicos nas empresas.
«A empatia está na moda, a ganância, ultrapassada». Primeira frase do prefácio do livro de Frans de Waal, 2009.
A executiva Melanie Healey, é uma das mulheres mais poderosas do mundo. Healy é a atual presidente mundial da Procter & Gamble, líder mundial de bens de consumo. Ela declara que sua receita de sucesso foi pragmatismo e empatia. Eu acredito. A Procter & Gamble foi a empresa que, na primeira década do século XXI, apoiou intensamente as experiências de uma disciplina que vinha crescendo de importância, o design thinking. Desde 2000, quando foi nomeado CEO da P&G, A.G. Lafley escolheu o design como um dos pilares da sua herança para a restruturação da empresa. Criou uma então inédita vice-presidência de design e inovação e indicou Claudia Kotchka para gerenciar uma verdadeira revolução interna.
O resultado desse projeto de anos já foi descrito em livros e artigos. Em 2004, Kotchka declarava que ela havia se tornado uma design thinker e que os designers sempre questionam os problemas estudados, empregando a empatia para entender melhor os usuários. Na experiência dela, era comum que os designers voltassem com a situação recomposta, redesenhada em um contexto mais rico e amplo, que permitisse uma solução mais holística. Em 2008, Lafley lançou um livro sobre a sua experiência como comandante da P&G. Lá, ele diz que «o design thinking é uma metodologia para a resolução de problemas ou a identificação de novas oportunidades utilizando ferramentas e modelos mentais aprendidos em faculdades de design». Disse mais, que o design thinking permitiu a sua administração em desenvolver fortes vínculos emocionais entre suas marcas e os consumidores, criando experiências encantadoras.
«Quando vestimos Armani, nós nos tornamos Armani». Tom Peters, Reimagine!, 2003.
Teóricos acadêmicos ou executivos práticos têm o hábito de colocar em uma mesma frase as palavras design e empatia. Para eles, a evolução criativa da mente humana, ou de uma empresa, passa pela capacidade das pessoas de colocarem-se no lugar do outro, uma habilidade que os design thinkers possuem por necessidade da profissão. Para minha empresa, empatia é uma ferramenta necessária para observar e entender os shoppers, os consumidores que estão em movimento pelos pontos de venda. Através da nossa investigação empática e etnográfica, nós conseguimos perceber os vínculos emocionais verdadeiros que geram insights criativos para a resolução dos problemas estudados.
Para o autor e presidente do DMI, Design Management Institute, Thomas Lockwood, a empatia é o primeiro princípio da prática do design thinking. Para a minha equipe, empatia é a chave para a compreensão de um problema, porque todos os nossos projetos começam com uma investigação empática. As empresas que têm orgulho de satisfazer seus clientes costumam fazer uma pesquisa com perguntas que são respondidas pelos usuários dos serviços ou consumidores dos produtos. Porém, através desse tipo tradicional de pesquisa de satisfação, não se consegue intuir as tendências ou projetar os próximos passos inovadores daquele modelo de negócio. O objetivo do processo do design thinking é entender os desejos não verbalizados dos nossos observados, para aprender suas necessidades, identificar desejos, explorar possibilidades e gerar soluções criativas.
Uma boa notícia é que empatia, quando em falta, pode ser exercitada. Como um músculo, se exercitada, pode manter sua empresa ativa e saudável. Existem exercícios envolvedores que despertam a visão empática. Chefes podem viver uma experiência como funcionários ou gestores podem observar os consumidores usando seus serviços ou produtos. A metodologia do design thinking consegue projetar diversos exercícios de empatia que podem abrir a porta da percepção. Procure pelo seu design thinker mais próximo e motive-se para transformar a sua empresa.
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