O design dos negócios

Design não é mais uma estética que se aplicava ao final de um processo. Design é o próprio processo.

Rique Nitzsche, autor AutorRique Nitzsche Seguidores: 278

«Bom design é bom negócio».

Thomas J. Watson Jr., em uma palestra em 1973 na Universidade da Pensilvânia.1

Habitante do território dos negócios, Watson Jr. percebeu desde cedo o valor do design. No início da década dos anos 1950, ele entrou em um showroom da Olivetti em Nova York. Ficou impactado e seduzido pelo ambiente, pelos produtos e a pela experiência. Entendeu a diferença entre a Olivetti e a IBM, que estava herdando do pai, Thomas J. Watson, o executivo conservador que consolidou a IBM. Watson Jr. entendeu que havia encontrado uma ferramenta para a mudança. Assim, procurou fazer do design uma diferença estratégica e conseguiu. «Eu poderia colocar meu selo na IBM através de um design moderno». Ele foi o presidente e diretor executivo da IBM durante o seu período de maior crescimento, quando a empresa deixou as tabulações mecânicas e máquinas de escrever para a era do computador. Watson Jr. foi um executivo de destaque da economia tradicional que a Fortune Magazine uma vez chamou de «o maior capitalista que jamais viveu».

«O Método do Design é como você organiza equipes multidisciplinares, como você explora a tecnologia ou quais práticas e processos você pode aplicar. Essas coisas, tão naturais como a respiração para um designer, não são usados ​​regularmente nos negócios».

Nick de Leon, 20072

O autor dessa frase havia sido nomeado responsável do programa da Design London que aceitaria os estudantes da pós-graduação: de Arte do Royal College of Art, de Engenharia do Imperial College e de Administração em Negócios do Tanaka Business School. Leon desejava mostrar o poder de transformação da combinação de design com engenharia, tecnologia e negócios. Em 2007, sua intenção era introduzir o Método do Design diretamente nos negócios. Leon, engenheiro e designer, trabalhou 30 anos na IBM e se tornou um evangelista do poder transformador do design. Ele escolheu a IBM para trabalhar porque a organização era uma das poucas que estaria comprometida com design. Mesmo assim, nos 5 primeiros anos ele se sentia como «um cabeleireiro solicitado a dar um corte rápido e uma escova» sobre um produto gerado pela engenharia. Ou seja, adicionando um «brilho» ou «valor agregado» aos «artefatos» da engenharia.

Leon foi nomeado diretor de desenvolvimento de negócios para a divisão de serviços globais da IBM na Europa e assistiu a dificuldade da organização em reagir ao agressivo crescimento da Dell. Os PCs da Dell não eram melhores dos da IBM, nem tinham uma cadeia de abastecimento ou assistência técnica melhores. Mas a Dell oferecia uma melhor experiência de compra para os usuários. Isso foi suficiente para abalar seriamente o negócio da IBM. Leon percebeu que as perguntas estratégicas da empresa estavam desfocadas. Ao invés de perguntar «Como vamos vender este material?», a pergunta correta deveria ser «Como os nossos clientes desejam comprar?». Em suma, Leon estava entendendo que o design de artefatos não deve ficar isolado do design das experiências humanas. O foco no produto deveria se fundir com o foco nas pessoas.

Em 2007, Leon estava consciente de que um dos critérios do sucesso, deste posicionamento de ensino do design, seria quando os profissionais da McKinsey ou da Accenture se tornassem parceiros estratégicos em levar esse programa de ensino para mudar seus próprios modelos de negócios. Na sua percepção, as consultorias estão envolvidas em projetar estágios iniciais dos negócios dos clientes. «Se conseguirmos uma grande injeção do Método do Design nas grandes consultorias, podemos alcançar não apenas as empresas da Fortune 500, mas organizações de todos os tamanhos. Se as empresas forem inovadoras, elas farão tudo melhor. Se as cidades tiverem melhores sistemas de inovação, elas irão prosperar». Helen Walters, autora da matéria da Business Week, terminava dizendo que o objetivo de Leon era mudar o mundo dos negócios.

Desde 2011, Nick Leon é Head of Service Design do Royal College of Art. Quanto à sua visão de 2007, algumas coisas aconteceram desde então. As grandes consultoria estão comprando empresas de design para incorporá-las aos seus negócios. Em 2013, a Accenture comprou duas: a Acquity Group, a segunda maior agência de marketing digital dos Estados Unidos e a inglesa Fjord, de design de serviços com 15 escritórios pelo planeta.3 Ainda em 2013, a Deloitte incorporou a Doblin, consultoria de design estratégico com escritórios em Chicago, NY e Londres, como uma unidade de inovação.4 Agora, em 2015, a McKinsey comprou a agência de design Lunar que irá manter seu nome e continuar operando a partir de seus escritórios em San Francisco, Chicago, Munique e Hong Kong. A principal diferença é que agora a Lunar assumirá projetos dos clientes da McKinsey, irá participar das práticas consultivas e ajudará os clientes comuns a construir as suas próprias práticas de design.5

«Eles estão esperando levar o design para a frente da estratégia, porque é uma ferramenta essencial para criar vantagem competitiva nos dias de hoje».

John Edson, presidente da Lunar (2015)

Um design thinker brasileiro, Tiago Justino, acaba de ser contratado pela Ernst & Young que, em 2014, adquiriu a Bedrock, de design estratégico. Sua função será desenvolver modelos de negócios que possam ser implantados dentro da própria E&Y, criando «uma estrutura de design estratégico dentro de um grupo de estratégia».6

Este aumento de interesse das consultorias sobre o design estratégico não é um fenômeno único. A Capital One, uma holding bancária, comprou em 2014 a Adaptive Path, uma agência baseada em San Francisco especializada em design de experiências e serviços.7 A inglesa Barclays, gigante fornecedor global de serviços financeiros é agora o maior empregadora de designers em Londres. A Singtel, de telecomunicações da Ásia, construiu um andar para sua equipe de design em Cingapura.8

Mas ninguém tem sido mais agressiva em trazer o design para o centro do seu negócio do que a IBM, que aumentou sua equipe de designers para 1.000 profissionais, tornando-se, por qualquer critério, a maior empresa de design do mundo. Todd Simmons foi uma das contratações em 2014, e se tornou o Vice Presidente de Brand Experience e Design da IBM. Simmons foi por 10 anos o diretor de criação da famosa Wolff Olins, onde assinou soluções ousadas, como o projeto das Olimpíadas de Londres. A própria Wolff Olins reconhece o trabalho como «inesperadamente dissonante». A IBM deseja transformar a sua entrega aos clientes, e arrisca em ser dissonante.

Em síntese, o mundo dos grandes negócios está absorvendo intensamente o design estratégico. A frase de 2007 de Leon começa a ficar lá, na história do design.

Como um designer com experiência em trabalhar de forma colaborativa com equipes estratégicas transdisciplinares, não tenho me assustado com as transformações em andamento. Nem desejo reclamar sobre limites territoriais, embora existam profissionais que se preocupam com a maciça contratação de designers pelas grandes corporações. Alegam que a profissão do designer está sendo ameaçada pela rápida absorção aos negócios algorítmicos tradicionais. Ao contrário, entendo que o comportamento heurístico está entrando nos territórios exclusivos dos algoritmos. Me lembro quando, há mais de 20 anos, uma respeitável amiga reclamava sobre a «invasão» dos territórios do marketing e da publicidade sobre o território do design. Minha sensação era a oposta. Achava que estávamos «invadindo» pacificamente outros territórios.

Ou seja, bom design estratégico é sempre bom negócio.

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  1. Essa frase vem sendo tão usada como referência da conexão de design e negócios que a IBM disponibilizou-a no seu site. «O foco da IBM no design tem suas raízes em um passeio de Thomas J. Watson Jr. pela Quinta Avenida, em Nova York, no início de 1950. Ele parou em uma loja da Olivetti, onde máquinas de escrever foram expostas na calçada para que os transeuntes experimentassem. As máquinas tinham designs elegantes e uma variedade de cores. No interior, a loja era clara e moderna. Em contrapartida, as áreas de exposição nos escritórios da IBM eram mal iluminadas e seus computadores eram insípidos e quadradões. O lobby da sede em Madison Avenue havia sido projetado para agradar a estética de início do século XX de Thomas Watson (seu pai). Poucos anos mais tarde, o filho escrevia que o ambiente parecia como um ‘salão de primeira classe em um transatlântico’. Watson Jr. estava se preparando para assumir o cargo de presidente-executivo da IBM, e decidiu: ‘Eu poderia colocar meu selo na IBM através de um design moderno’». Good Design is Good Business.
  2. Nick de Leon, citado por Helen Walters, na matéria Stirring Design Into Business, em 04 de outubro de 2007, no site da Business Week, atual Bloomberg Business, página de Innovation & Design. Leon é PhD em Smart Cities pelo Imperial College London. Na época, Helen Walters era a editora de Inovação da BusinessWeek.com e Design Channel.
  3. O mercado tomou conhecimento através de diversas notícias divulgadas pela mídia. Seguem duas referências: Post-Acquisition, Acquity Group Talks Digital Transformation Challenges e Accenture Completes Acquisition of Fjord, Expanding Digital and Marketing Capabilities.
  4. Doblin.
  5. TheConsultantLounge, na matéria McKinsey Acquires Lunar Design, no site theconsultantlounge.com, em 17 de maio de 2015.
  6. Informação adquirida em conversas particulares sobre o mercado norte-americano.
  7. Design Firm Adaptive Path Acquired By Capital One.
  8. Robert Fabricant, na matéria The Rapidly Disappearing Business of Design, no site wired.com, em 29 de dezembro de 2014.
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A consciência e o design Consciência e design são tão disponíveis que só os percebemos quando nos surpreendem, pela falta ou pela exuberância.

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Retrato de Candelaria Moreno
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Mai. 2016

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